«Para além de todas as listas e enumerações de princípios deverá sempre permanecer a afirmação do UNO – a Realidade inefável da qual e na qual todas as coisas têm o seu ser. Não poderá haver uma cabal compreensão da Teosofia sem a constante referência a esta fundamental Unidade... — a UNICIDADE DA VIDA.»[1]
A essência da Teosofia consiste na harmonização perfeita do Divino com o humano no homem. É esta a máxima que podemos encontrar subjacente em textos teosóficos clássicos tais como o da Voz do Silêncio de H. P. Blavatsky. Contudo, o homem de hoje é seguidor acérrimo de um estar e de um ser a que convencionou denominar por modernidade e que caracterizou segundo diversos itens conforme o seu estado de espírito, o seu grupo de pertença ou referência sócio-económica, segundo a sua ideologia, crença ou o seu particular sistema de valores. No que respeita à nossa sociedade em particular, modernidade é sinónimo de consumo e este, por sua vez contrapõe-se a estados do Ser e do Sentir onde o Escutar e o Criar permitem um tal Estar-em-Plenitude que, em última análise vão ao encontro da famosa máxima socrática: Homem, conhece-te a ti próprio!... E, conhecendo-te, conhecerás o Universo e os próprios deuses!...
Livros como A Voz do Silêncio são obras não para serem consumidas, no sentido mais corrente do termo, mas para serem encaradas como portais que nos permitem o tal Estar-em-Plenitude. Contudo, não basta bater e abrir no portal, será necessário olharmos para a obra como se estivéssemos a olhar um espelho, com disponibilidade, sem julgamento ou pré-conceito, e olharmo-nos no fundo de nós próprios, onde, e só onde, teremos acesso àquele Sentir, àquele Ser que oferece tão generosamente o acto de Criar. Mas não deixemos de prestar atenção ao que é referido:
"Não separarás o teu ser do SER, e do resto, mas fundirás o oceano na gota de água, e a gota de água no oceano.
Assim estarás em acordo com tudo quanto vive..."[2]
Os três Fragmentos de A Voz dos Silêncio, por sua vez retirados do Livro dos Preceitos Áureos, escritos desde tempos imemoriais, dão-nos indicações muito precisas, simultaneamente simples e complexas, sobre a demanda do Homem Interior, sobre a Iniciação aos Mistérios, através do Autoconhecimento e da Renúncia. O Homem Interior olhemo-lo como à pérola dentro da concha, no fundo incerto e desconhecido do Oceano — não a vislumbramos, mas ela está lá! Um Iniciado nos Mistérios, em última análise, é o Ser que olha em frente e SABE o Caminho a percorrer, isto é, conhece o Sentido da Peregrinação. Ter acesso aos Mistérios é compreender os fins últimos da VIDA CÓSMICA, em que a vida e a morte humanas e terrenas não passam de fenómenos episódicos. Pela Renúncia da vida dos sentidos, o Homem alcança a Vida Eterna, na medida em que consegue escutar o SOM SEM SOM, o Som da Criação — A VOZ DO SILÊNCIO.
Uma Lei Fundamental e Quatro Ideias Básicas da Teosofia[3]
(segundo H. P. Blavatsky):
«A unidade radical da essência última de cada parte constituinte dos compostos da Natureza — desde a estrela ao átomo mineral, do mais elevado Dhyan Choan[4] ao mais pequeno infusório, no verdadeiro sentido do termo, e quando aplicado aos mundos espiritual, intelectual, e físico —esta unidade, é a única lei fundamental da Ciência Oculta.
Observe as seguintes regras:
Não importa o que se possa estudar n’ «A Doutrina Secreta», deve sim deixar-se a mente manter-se firme, como base da sua ideação, em relação às seguintes ideias:
a) A UNIDADE FUNDAMENTAL DE TODA A EXISTÊNCIA. Esta unidade é uma coisa completamente diferente da noção que vulgarmente se tem de unidade — como quando dizemos que uma nação ou um exército estão unidos; ou que este planeta está unido àquele por linhas de força magnética ou semelhança. A mensagem não é essa. Ela é a de que a existência é UNA, não uma colecção de coisas ligadas umas às outras. Fundamentalmente há UM Ser. O SER tem dois aspectos, positivo e negativo. O positivo é Espírito ou CONSCIÊNCIA. O negativo é SUBSTÂNCIA, o sujeito da consciência. Este Ser é o Absoluto na sua manifestação primária. Sendo absoluto nada há para além dele. É o SER-TOTAL. Ele é indivisível, de outro modo não seria absoluto. Se uma parte pudesse ser separada, a que restasse não poderia ser absoluta, porque surgiria imediatamente a questão da COMPARAÇÃO entre ela e a parte separada. Comparação é incompatível com qualquer ideia de absoluto. No entanto, é claro que esta EXISTÊNCIA UNA fundamental, ou Ser Absoluto, deverá ser a Realidade em qualquer forma que exista.
O Átomo, o Homem, o Deus são, quer cada um separadamente, quer todos colectivamente, o Ser Absoluto na sua análise última, que é a sua REAL INDIVIDUALIDADE. É esta ideia que deverá prevalecer sempre no fundo da mente para servir como base a toda a concepção que resulte do estudo da Doutrina Secreta. No momento em que esquecermos isto — e é muito fácil fazê-lo quando estamos ocupados com alguns dos muitos aspectos da Filosofia Esotérica —, a ideia de SEPARAÇÃO sobrevem e o estudo perde o seu valor.
b) A segunda ideia a fixar é a de que NÃO HÁ MATÉRIA MORTA. Todo átomo último está vivo. Nem poderia ser de outro modo, uma vez que todo o átomo é ele próprio fundamentalmente Ser Absoluto. Por isso não existem coisas tais como espaços de Ether[5] ou Akasha[6], ou o que quer que lhe chamais, nos quais anjos e elementais se divertem como trutas na água. Isso é uma ideia comum. A verdadeira ideia mostra que cada átomo de substância, não importa de que plano, é ele próprio uma VIDA.
c) A terceira ideia a fixar é a de que o Homem é o MICROCOSMOS. E sendo-o, então todas as Hierarquias existem dentro dele. Mas na verdade não existe nem Macrocosmos nem Microcosmos mas UMA EXISTÊNCIA. O grande e o pequeno existem como tal apenas quando visualizados por uma consciência limitada.
d) A quarta e última ideia básica a fixar é a de que está expressa no Grande Axioma Hermético. Na realidade ela é o somatório e a síntese de todas as outras.
O que está Dentro é como o que está Fora; assim como o Grande é como o Pequeno; o que está em cima é como o que está em baixo; não há senão UMA VIDA E UMA LEI; e o que trabalha é UNO. Nada é Interior, nada é Exterior; nada é GRANDE, nada é Pequeno, nada é Alto, nada é baixo, na Economia Divina.
Não importa aquilo que estudarmos n' «A Doutrina Secreta», deveremos sim, correlacioná-lo com estas ideias básicas.» [7]
Rui Arimateia "Textos Teosóficos IX"
Ramo Boa-Vontade de Évora Sociedade Teosófica de Portugal
NOTAS:
[1] Ianthe H. Hoskins — Foundations of Esoteric Philosophy from the writings of H.P. Blavatsky, Ed. The Theosophical Publishing House Ltd, Londres,1980.
[2] H.P.Blavatsky — A Voz do Silêncio, Col. 'Teosófica e Esotérica'-V, Livraria Clássica Editora de A. M. Teixeira, Lisboa, 1921 (Versão portuguesa de Fernando Pessoa, pág. 60).
[3] In «The Secret Doctrine» de H.P.Blavatsky, Londres, 1888.
[4] Do Sânscrito, significando, literalmente, “Os Senhores da Luz”. Os mais elevados deuses, correspondendo aos Arcanjos da tradição Católica Romana. São as Inteligências divinas encarregadas pela supervisão do Kosmos.
[5] Ether, segundo H.P.Blavatsky, é um agente material extremamente subtil que ‘envolve’ toda a manifestação física.
[6] Akasha, palavra do Sânscrito que, ainda segundo H. P. Blavatsky, significa a essência espiritual subtil e super-sensível que penetra todo o espaço. É o Espaço Universal em que permanece imanente a Ideação eterna do Universo nos seus sempre mutáveis aspectos sobre os planos da matéria e da objectividade... Akasha é a substância viva e primordial... Todas as formas e ideias do universo vivem nele...
[7] in Foundations of Esoteric Philosophy from the writings of H.P.Blavatsky , Organização, Prefácio e Notas por Ianthe H. Hoskins, Ed. Theosophical Publishing House Ltd., Londres, 1980. Tadução do Ramo "Boa-Vontade" (Évora) da Sociedade Teosófica de Portugal.
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